Opinião

O feedback pode transformar a cultura de uma empresa

O feedback pode transformar a cultura de uma empresa - InBrief - Simples, Direto, Essencial

A cultura organizacional não é apenas um conceito. É, a meu ver, o coração de uma empresa. Vai muito além de valores formais ou de políticas cuidadosamente elaboradas. Tem que ver com práticas constantes que incentivam o crescimento contínuo, a segurança psicológica, a confiança e o bem-estar.

O feedback é uma dessas práticas. Muito se fala na sua importância e vários estudos apontam a sua falta como um dos principais fatores de desmotivação. O problema é que o feedback é muitas vezes encarado como uma mera ferramenta de avaliação de desempenho (ou até de controlo) quando, na verdade, é um dos principais mecanismos para promover uma cultura organizacional de excelência.

O feedback deve ser uma ferramenta estratégica. Só uma comunicação honesta, contínua e construtiva possibilita evolução. Se não o fizermos, segue-se o distanciamento, a estagnação do valor acrescentado ou até a sua diminuição, fruto da desmotivação.

Dar e receber feedback honesto e construtivo é difícil. É desconfortável. Mas é no desconforto que crescemos e as empresas portuguesas têm ainda um longo caminho a percorrer no sentido de encarar o desconforto, de o normalizar e de aprender a dar feedback enquanto motor de transformação para melhores resultados. Exige coragem e empenho.

Foco nas qualidades

Valorizar os pontos fortes é um excelente ponto de partida para transmitir feedback construtivo sem que quem o receba se sinta ameaçado ou envergonhado. Por exemplo, se um trabalhador tende a interromper colegas ou clientes, o líder pode destacar a sua proatividade e entusiasmo, sugerindo um equilíbrio que garanta que todas as vozes tenham espaço. Por outro lado, se um trabalhador evita confrontos e não dá a sua opinião, pode salientar-se a sua empatia e preocupação com o bem-estar da equipa, encorajando-o a partilhar a sua visão e ideias.

Esta abordagem dá confiança e motivação a quem recebe o feedback porque aborda as dificuldades sem anular o que a pessoa tem de melhor, utilizando essas qualidades como alavancas para ultrapassar os desafios.

Se o problema for a dificuldade em delegar tarefas, pode destacar-se o comprometimento da pessoa e a qualidade no trabalho que entrega, estimulando-a a confiar na equipa e a libertar tempo para tomar decisões estratégicas e ajudar outros a crescerem. Se demorar muito tempo a decidir, deve valorizar-se a capacidade de análise e rigor, convidando o trabalhador a confiar em si e transmitindo que há espaço para o erro.

E se houver falta de iniciativa e o trabalhador estiver sempre à espera de orientação? Pode destacar-se o cuidado e responsabilidade demonstrados, transmitindo confiança para arriscar. E aquele trabalhador que chega atrasado? Que tal realçar os seus resultados e o foco quando está presente, transmitindo que a pontualidade eleva o seu profissionalismo?

O feedback também é importante de um ponto de vista coletivo. Se uma determinada equipa está com dificuldades na colaboração, o líder deve orientar essa melhoria, reconhecendo o esforço de cada um e destacando áreas de melhoria conjunta. Isto é particularmente útil em momentos de mudança, como quando há rotatividade de funções, novos membros ou novos objetivos de negócio.

Feedback Construtivo nas Empresas: Como Criar Cultura Saudável

Partir dos pontos fortes permite reconhecer o valor dos trabalhadores e das equipas, mesmo quando existem aspetos a melhorar. Preserva a motivação, reforça o compromisso e o sentimento de pertença. Ao destacar as intenções positivas por trás de certos comportamentos menos eficazes, cria-se abertura para a mudança, sem que as pessoas se sintam diminuídas. O feedback passa, assim, a ser uma ferramenta de construção, não de julgamento. Passa a sustentar relações de confiança, segurança e crescimento contínuo.

Manter a continuidade do feedback de um modo sustentável

Só um feedback contínuo produzirá os resultados desejados, mas essa continuidade tem de ser sustentável. De nada adiantam reuniões sem propósito, relatórios sem acompanhamento ou formulários padronizados.

Cada empresa saberá o que funciona melhor no seu dia a dia e cada líder saberá o que terá um impacto mais positivo na sua equipa, individual e coletivamente. Mas, para saber tudo isto, é necessário implementar, testar, recolher feedback e melhorar, continuamente.

É possível que as pessoas partilhem feedback construtivo e informalmente em momentos espontâneos, como numa pausa para o café ou através da plataforma interna que a empresa utilize. Se isto acontecer, é sinal que a cultura está a fortalecer-se.

No entanto, é desejável que sejam planeados momentos para o feedback, que podem ocorrer em reuniões estruturadas onde se discute o progresso, se identificam os desafios e se celebram conquistas. É nestas reuniões que normalizamos o desconforto e fomentamos a confiança e a motivação dos trabalhadores. É também nestas reuniões que aprendemos e ensinamos a transmitir e a receber feedback construtivo, potenciando a referida espontaneidade informal do dia a dia.

Estas reuniões devem ter a regularidade que fizer sentido, tendo sempre em conta a estrutura da empresa. Devem ser assegurados momentos de feedback individuais e coletivos, com os objetivos bem definidos. Devem fluir de forma empática e pragmática. É também aconselhável que haja reuniões de feedback (individuais e/ou coletivas) mais curtas e regulares e, por outro lado, reuniões mais estratégicas com análises mais profundas (trimestrais, por exemplo). Estes momentos de feedback não concorrem entre si, complementam-se. E funcionam em qualquer tipo de empresa, desde que haja clareza nos objetivos e preparação.

Feedback Construtivo nas Empresas: Como Criar Cultura Saudável

Sentados do mesmo lado da mesa

O feedback construtivo e contínuo só funciona se acontecer de um modo próximo. A expressão da Brené Brown “sentados do mesmo lado da mesailustra bem esta proximidade.

A forma como se dá feedback é tão importante como o seu conteúdo. De que serve focarmos nas qualidades para abordarmos e ultrapassarmos desafios se o fazemos de um lugar distante, de cima para baixo?

Onde conversamos com as pessoas? Onde damos feedback e possibilitamos recebê-lo? Se chamarmos um trabalhador ao gabinete, mas nos mantivermos em lados opostos da secretária, por vezes com ecrãs que nos dividem e, quem sabe, a olhar para as horas, isso será realmente construtivo apesar de o discurso o (aparentar) ser? Não! Não é preciso parecer, é preciso ser. Ser-se verdadeiramente interessado, estar presente, escutar e aceitar o desconforto do momento.

Nem sempre é possível ter uma mesa redonda ou cadeiras lado a lado, mas é sempre possível sentarmo-nos simbolicamente do mesmo lado, mostrando empatia, fazendo perguntas com curiosidade genuína e criando espaço para escutar. Isto é o que transforma o feedback numa relação e não numa imposição.

O mesmo se aplica quando não somos nós a iniciar uma conversa. Se alguém pretende comunicar algo, fazer uma crítica ou manifestar um desconforto, temos de ser capazes de nos colocar ao seu lado, escutar e transmitir segurança de que o assunto não ficará esquecido.

O feedback não é um evento, é um processo contínuo que deve ser levado a cabo com proximidade, intenção e atenção.

Talvez a regra de ouro seja apenas darmos feedback quando estivermos disponíveis para nos “sentarmos do mesmo lado da mesa”, quando estivermos emocionalmente disponíveis e com a intenção bem definida de focar nas qualidades. Quando fazemos isto, estamos verdadeiramente a cuidar das nossas pessoas e organizações.

Termino citando a Brené Brown: “a vitória não é receber bom feedback, evitar dar feedback difícil ou evitar a necessidade de feedback. Em vez disso, é tirar a armadura, aparecermos e empenharmo-nos”. Acrescento: evoluirmos. Juntos.

author avatar
A. Isa Rocha
A Isa é advogada de direito do trabalho para empresas e cofundadora da sociedade de advogados Rocha & Barros, sediada em Braga. Licenciada em direito pela Universidade de Coimbra, aprofundou os seus conhecimentos em direito do trabalho com uma pós-graduação nessa área, aliada à experiência diária com empresas. Foca-se em proporcionar às empresas segurança jurídica, saúde financeira e bem-estar organizacional. É também formadora na área do direito do trabalho, colaborando com líderes e equipas de recursos humanos para promover ambientes de trabalho mais eficazes e alinhados com as necessidades do negócio.

2 Comentários

  1. Taxa de Depósito do BCE: Como Afeta o Seu Dinheiro?

    19 Junho, 2025

    […] esse excesso de dinheiro no BCE. Assim, recebem juros por isso. Nenhum banco vai emprestar a uma taxa inferior à que pode obter no BCE. Isto faz com que a taxa de depósito funcione como uma referência natural para o […]

  2. Ato Isolado: Como Emitir e Pagar Menos Impostos em 2025

    19 Junho, 2025

    […] Insira os dados do seu cliente. Se for uma empresa, os dados podem aparecer automaticamente. Caso contrário, preencha-os […]

Deixa um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Também pode gostar

Alem da Superfície: Como os Rios Urbanos Podem Regenerar as Cidades e o Planeta - InBrief - Simples, Direto, Essencial
Opinião

Alem da Superfície: Como os Rios Urbanos Podem Regenerar as Cidades e o Planeta

Rios Vivos, Futuros Sustentáveis: A Nova Fronteira da Descarbonização Urbana Vivemos um momento decisivo para o futuro das cidades e
Porto e Região Metropolitana Norte: Diagnóstico Ambiental e Caminhos Sustentáveis - InBrief - Simples, Direto, Essencial
Opinião

Porto e Região Metropolitana Norte: Diagnóstico Ambiental e Caminhos Sustentáveis

Por: Carlos Alberto Tavares Ferreira CEO Carbon Zero Portugal é reconhecido por sua beleza natural e cultura vibrante, mas enfrenta